26/01/2015

O que é ser cigano?

Definir a identidade cigana é bem mais difícil do que parece. Subdivididos em 3 principais etnias 9rom, calon e sinti), eles não constituem um povo homogêneo. Nem todos são nômades. Nem todos falam romani. Nem todos dançam ao redor de fogueiras ou usam roupas coloridas. Podem ser pobres ou ricos. Podem ser cristãos, muçulmanos, judeus. O que faz deles um povo é uma sensação comum de não serem gadgés – como eles chamam os não-ciganos – e de se identificarem com rom, calon ou sinti. “O termo ‘cigano’ só funciona nessa oposição”, diz o pesquisador Frans Moonen, autor do livro Anticiganismo – Os Ciganos na Europa e no Brasil.


Mas, apesar de todas as divergências, algumas características permitem traçar um perfil comum a esses grupos. A primeira delas é o espírito viajante. Ainda que nem todos sejam nômades, os ciganos não se sentem pertencentes a um único lugar. Não criam raízes, não têm uma noção concreta de propriedade – estão sempre fazendo negócios com seus pertences, preferencialmente em ouro, que não perde valor e é aceito em qualquer nação (por isso a imagem cigana é vinculada ao uso do ouro como adereço, especialmente nos dentes das mulheres). Eles não gostam de se submeter a leis e as regras que não sejam deles. Prezam, acima de tudo, a liberdade.  Assim, podem até se estabelecer por muito tempo em um mesmo lugar (como é comum entre os sinti). Mas, nesse caso, procuram morar em uma mesma rua ou, de preferência, em acampamentos onde possam preservar sua autonomia e manter a unidade familiar – outro aspecto primordial na vida cigana.  

É em torno da família que uma comunidade cigana se organiza. Há um líder, sempre um homem, nomeado por mérito e não por herança. Ele é escolhido levando em conta vários aspectos. Um deles, importantíssimo para conseguir alugar um terreno, montar um circo ou participar de férias, é ter documento de identidade, o que se tornou um verdadeiro desafio – o cigano não consegue registrar o nascimento dos filhos porque não possui documentos próprios, em um processo sem fim.  Também deve ser um bom interlocutor entre o público e seu grupo, além de ter habilidade para resolver problemas internos do acampamento. É ele quem dita as regras, divide as tarefas, cria as leis do grupo.


Trecho de uma matéria da revista Super Interessante
assinada por Luciano Marsiglia.